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Quando falta o pai: a ferida do masculino e o medo do feminino

  • Foto do escritor: Saulo Ricardo
    Saulo Ricardo
  • 16 de abr.
  • 2 min de leitura

Atualizado: 24 de abr.


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Muitos homens sentem que algo está fora do lugar dentro de si.


Mesmo que conquistem respeito, carreira ou relacionamentos, carregam um vazio silencioso, uma inquietação difícil de nomear.


Esse incômodo, por vezes, não vem de algo que fizeram — mas daquilo que faltou: a presença do pai. Sem esse referencial, muitos cresceram com dúvidas sobre como ser homem, como lidar com o próprio corpo, com a raiva, com o medo e, sobretudo, com a intimidade.


A primeira grande experiência de todo ser humano é com a mãe. Ela nos acolhe no ventre, nos alimenta com seu sangue e, ao nascer, segue como ponte para o mundo. Quando essa presença é amorosa, gera um senso de pertencimento. Mas quando é ferida, ausente ou excessiva, pode deixar marcas profundas no corpo e na alma.


James Hollis afirma que o poder do feminino — representado inicialmente pela mãe — é imenso na organização da psique masculina. É dela que surge o primeiro complexo: o materno. Esse vínculo, se não for elaborado, pode prender o homem a padrões infantis e influenciar todos os seus relacionamentos.


Jung lembrava que a criança é afetada não apenas pelo que os pais viveram, mas também pelo que deixaram de viver. Muitas mães, impedidas de realizar seus próprios desejos, os projetam nos filhos, gerando uma confusão entre amor e domínio. O homem cresce tentando corresponder a esse ideal materno ou fugindo dele — mas ainda preso.


Quando o pai está ausente — física ou emocionalmente — não há quem introduza o filho no mundo simbólico do masculino. O pai é o primeiro a romper a fusão com a mãe, abrindo espaço para a individualidade. Sem ele, o menino permanece imerso no universo materno, sem aprender a lidar com sua agressividade natural ou com seus instintos. E o que é reprimido, volta como raiva, culpa ou até violência.


Guy Corneau mostra como essa ausência paterna afasta o homem do próprio corpo e das emoções mais íntimas. Intimidade, aliás, é um dos maiores desafios modernos. Ela exige contato com o que há de mais profundo — mas muitos homens se tornaram estranhos a si mesmos.


Essa desconexão interna leva muitos homens a buscar no outro — nas mulheres, nos parceiros, nas conquistas — a parte que perderam de si. Quando não reconhecem sua anima, seu lado feminino, acabam projetando nela seus medos, desejos e frustrações. O resultado pode ser o controle, o ciúme, a negação, ou até a violência.


A jornada do homem moderno passa pelo resgate da própria alma. E isso exige revisitar a relação com a mãe, enfrentar a ausência do pai e aprender a lidar com a dor de crescer. Sem esse mergulho, ele seguirá à mercê de padrões infantis, sabotando seus vínculos e vivendo uma masculinidade ferida.


Talvez a pergunta mais importante para os homens de hoje seja: "Que parte de mim ainda está tentando ser amado pelo pai que não tive?"


Referências:

CORNEAU, Guy. Pai ausente, filho carente. 1.ed. Barueri: Manole, 2015.

HOLLIS, James. Sob a sombra de Saturno: a ferida e a cura dos homens. 1.ed. São Paulo: Paulus, 1997.

 
 
 

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